Flávia Oliveira, colunista |
As investigações do esquema de corrupção alcançaram
a Petrobras, orgulho nacional; as maiores empreiteiras, Odebrecht à frente; a
JBS, potência do agronegócio; estão nas bordas do setor financeiro. No Rio de
Janeiro, envolveram construtoras, concessionárias, joalherias e, nos últimos
dias, adentraram o setor de transportes, com a prisão de Jacob Barata Filho,
empresário de ônibus, e Lélis Teixeira, número um da Fetranspor. A descoberta
das fraudes feriu a democracia, mas também um modelo de atuação que o mundo
corporativo brasileiro precisa enterrar.
A Fundação Cidadania Inteligente, nascida no Chile
em 2009 para promover a participação cidadã e fortalecer democracias
latino-americanas, mapeou o dinheiro envolvido nas relações entre 16
empreiteiras citadas na Lava-Jato e o poder público num estudo batizado de “A
teia e a trama”.
Os pesquisadores tomaram por base empréstimos
concedidos pelo BNDES às empresas de 2006 a 2014, contratos celebrados entre a
Petrobras e as companhias, doações oficiais a partidos nas eleições de 2014 e
multas estabelecidas nos acordos de leniência. A representação gráfica da
circulação dos recursos mostra o papel central das grandes empresas nacionais
na crise política. Diz o estudo:
“Basta olhar para os altos valores e a abrangência
de partidos (28 ao todo) que tiveram campanhas financiadas por empresas
envolvidas nas denúncias da Lava-Jato e como estas mesmas empresas foram
diretamente beneficiadas por altos financiamentos públicos e favorecimento em
contratos com o Estado. Cada relação estabelecida parece aumentar a sensação de
que se trata de um sistema político cuja dinâmica é moldada para garantir os
interesses das grandes empresas e falha na promoção do bem comum”.
Na segunda quinzena de maio, após vir a público a
delação de Joesley Batista, que deu início à agonia do governo Michel Temer, o
Instituto Ethos defendeu em nota oficial a realização de eleições diretas para
“trazer a estabilidade necessária para o país retomar o caminho do
desenvolvimento em bases íntegras e éticas”. Tratou da política. Faltou falar
da economia.
Se, de um lado, há líderes políticos e indivíduos
em funções públicas maculando as posições que ocupam, de outro há empresários e
executivos fazendo girar a roda da corrupção em troca de benesses. Atentam
contra a sociedade como um todo e são desleais com seus pares. Atuam em
desacordo com o que há de moderno e íntegro em termos de gestão. Conselhos
profissionais e entidades empresariais de peso, como CNI, CNA, Fiesp e Firjan,
costumam cobrar ética do Executivo e do Legislativo, mas pouco ou quase nada
falam sobre executivos e companhias cúmplices dos crimes.
Transparência, ética, responsabilidade
socioambiental — reputação, enfim — são atributos exigidos das corporações na
economia moderna. Chegam aos estertores os alimentos industrializados apinhados
de sódio, gordura trans, açúcar. Não cai bem a moda barata à custa do trabalho
degradante, análogo à escravidão, de homens, mulheres, crianças.
É imperdoável aumentar a produção agropecuária
derrubando floresta nativa e massacrando povos indígenas. Não é boa ideia
apoiar competições esportivas organizadas por entidades tomadas pelo
autoritarismo e pela corrupção. Foi-se o tempo em que eficiência e
competitividade podiam ser trocadas por propina. A sociedade há de cobrar do
setor privado a faxina que exige de instituições e figuras públicas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário