Até o dia em que o juiz Sérgio Moro
vier a encerrar o julgamento de Lula, quatro palavras dividirão opiniões.
Disse? Não disse? Nessa queda de braço com seu ex-amigo e empreiteiro Léo
Pinheiro, sócio da OAS, Lula joga sua liberdade. O prestativo mandarim
acompanhou uma visita do casal Silva ao apartamento do edifício Solaris, no
Guarujá. Segundo ele, em “abril ou maio” de 2014, Lula disse-lhe que destruísse
quaisquer anotações relacionadas com suas transações com o então tesoureiro do
PT, João Vaccari Neto. Lula nega, e não há testemunha dessa conversa.
Lula também nega que seja o
proprietário do apartamento, cuja reforma acompanhou. Até bem pouco tempo Léo
Pinheiro negava que a OAS distribuísse capilés e operasse políticos pelo caixa
2. É difícil saber quando qualquer um dos dois diz a verdade.
A Polícia Federal e o Ministério Público
poderão levantar detalhes que ajudem a esclarecer o mistério das quatro
palavras. (O da serventia do apartamento nunca foi um enigma respeitável.)
Passaram-se três anos e a ordem dos
fatos embaralhou-se na memória de quem é obrigado a cuidar da própria vida.
Tomando-se “abril ou maio” como referência, percebe-se que estranhas coisas
estavam acontecendo e poderiam justificar a recomendação. No dia 17 de março a
Polícia Federal prendera o operador Alberto Youssef. No dia 20, caiu Paulo
Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras. Dias depois Nestor Cerveró, outro
ex-diretor, foi para a Europa, em férias.
Em seu escritório, o advogado Márcio
Thomaz Bastos prenunciava uma tempestade. Em 2011 ele conseguira uma vitória
espetacular das empreiteiras sobre a Polícia Federal e o Ministério Público,
anulando a Operação Castelo de Areia no Superior Tribunal de Justiça.
A tempestade chegou em junho, quando
um procurador suíço bloqueou US$ 23 milhões depositados por Paulo Roberto
Costa. Ele havia sido libertado, e um juiz pouco conhecido mandou prendê-lo de
novo. Era Sérgio Moro.
Percebia-se que se estabelecera uma
colaboração entre Curitiba e Genebra. Se essa colaboração vazou em “abril ou
maio”, não se sabe. Sabe-se, porém, que Lula chamou Léo Pinheiro ao seu
instituto. Estava “preocupado” e fez uma pergunta “muito objetiva, muito
clara”: “Se a OAS tinha feito algum pagamento no exterior para João Vaccari”.
Depois, tratando de eventuais anotações contábeis de Léo Pinheiro com o PT,
disse-lhe: “Se tiver, você destrua”.
Abre-se uma questão. É provável que
Pinheiro e a OAS tivessem anotações. Se elas existiram seria razoável que
fossem destruídas ou, pelo menos, transferidas para um lugar seguro.
Marcelo Odebrecht só mandou
“higienizar” os “apetrechos” de suas “operações estruturadas” em novembro de
2014, quando diretores da empreiteira foram presos. Essa circunstância mostra a
extensão da onipotência dos mandarins das empreiteiras. Apesar disso, o caso de
Léo Pinheiro é diferente. Ele recebeu a recomendação de Lula, um ex-presidente
da República, padrinho da titular do cargo e comissário-chefe do PT.
A defesa de Lula sustenta que Léo
Pinheiro inventou essa história para salvar a própria pele. Se ele mostrar
quais provas destruiu, como e quando, fortalece sua denúncia.
TEM CAIXA DOIS, ESTÁ AQUI
As investigações haverão de
esclarecer se Lula disse a Léo Pinheiro que deveria destruir suas anotações,
mas a polícia e o Ministério Público poderão verificar um episódio onde deu-se
o inverso: a Odebrecht diz que enviou a Dilma Roussef as provas da corrupção de
sua campanha na eleição de 2014. O portador dos papéis teria sido o governador
de Minas Gerais, Fernando Pimentel.
São dois os testemunhos da Odebrecht.
Um, de Marcelo, seu presidente, outro de João Nogueira, um dos seus templários.
Os documentos teriam sido levados a Dilma depois de 17 de novembro e antes de
29 de dezembro. A manobra poderia ser chamada de chantagem ou, numa versão bem
educada, ameaça: Me ajude, senão você morre comigo.
A empreiteira estava desesperada pois
tinha vários diretores trancados em Curitiba. Já não se tratava de buscar a
nulidade da Lava-Jato numa manobra tipo Castelo de Areia 2.0. Era desespero
mesmo.
Passados os feriados de fim de ano, a
Advocacia-Geral da União defendeu o recurso a balsâmicos acordos de leniência,
para evitar que empresas fossem prejudicadas por causa da conduta de
funcionários. Já a Controladoria-Geral defendeu a cobrança de multas às
empresas, deixando-se as coisas no âmbito administrativo. A casa continuou
caindo, e, em fevereiro, a Camargo Corrêa acertou sua colaboração com o MP.
Emílio Odebrecht escreveu um artigo
intitulado “Uma agenda para o futuro” e ensinou: “Corrupção é um problema
grave, mas é fundamental dedicar nossas energias para o debate sobre o que é
preciso fazer para mudarmos o país”.
Um mês depois, em junho de 2015,
Marcelo Odebrecht foi preso. Desde então, pai e filho dedicam suas energias a
revelar o que fizeram, como fizeram e com quem fizeram.
MADAME NATASHA
Madame Natasha quer pedir ajuda ao
Ministério Público para combater o caixa 2, por onde trafegam expressões da
língua inglesa que acabam enfiadas no cotidiano nacional.
Quando a senhora ouviu pela primeira
vez a palavra “empoderamento” pensou em suicídio. Passou o tempo e ela
reconhece que, assim como o caixa 2 das empreiteiras, o seu uso disseminou-se.
Natasha orgulhosamente anuncia que o
uso dessa maldita palavra ganhou um ilustre patrono. Marcelo Odebrecht revelou
que mantinha uma política de “empoderamento” de seus principais executivos,
“empoderando-os” para tratar da distribuição de capilés.
MÁ NOTÍCIA
Para quem acha que o poder das
empreiteiras foi abalado, aqui vai uma má notícia:
Está na Câmara, depois de ter sido
aprovado pelo Senado, um projeto que esburaca a Lei das Licitações, permitindo
que o poder público contrate obras com valor abaixo de R$ 20 milhões a partir
de simples anteprojetos.
Os deputados poderiam aproveitar o
embalo fixando um teto para o percentual das propinas dos prefeitos,
governadores e ministros.
BOA NOTÍCIA
Em janeiro 6 alunos do ensino médio
do Rio foram aceitos para o torneio de Matemática da Universidade Harvard e do
Massachusetts Institute of Technology. Precisavam de R$ 44 mil para a viagem
até Boston e recorreram a uma vaquinha eletrônica. Conseguiram a grana e
embarcaram. (Uma boa alma doou R$ 10 mil).
Numa das competições a equipe tinha
1h para formular dez problemas difíceis. Os brasileiros ficaram em 45º lugar,
numa disputa em que havia representantes de cem países.
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