segunda-feira, outubro 19, 2015

*A exposição da criança à violência da mídia - Parte 2

Marilene Parente
Prosseguindo a discussão da violência que a mídia coloca nos nossos lares a toda hora, com base em um livro publicado pela UNESCO, começo contando uma experiência que tive há uma semana, quando fui a uma das mais frequentadas pizzarias da cidade de Itaituba. Ao chegar lá, encontrei uma festinha de aniversário de um coleguinha do Parentinho, onde havia algumas crianças. Bem ao lado, um senhor bem parecido, de cerca de 30 anos, com o controle remoto da TV da pizzaria na mão para que ninguém trocasse de canal, assistia ao filme O Exorcista. Ninguém da direção tomou providência. Dois dias depois voltei ao mesmo local, onde encontrei outro senhor um pouco mais velho, com duas crianças, uma de mais ou menos cinco anos e outra de uns três anos vendo um filme violento no mesmo aparelho de TV.  Aquilo me chocou muito. Em ambos os casos mandei meu filho sentar de costas para o televisor. Isso demonstra o quanto a violência foi banalizada.
Voltando ao trabalho da UNESCO, o fato de os EUA distribuírem a maior parte da violência na mídia no mundo todo leva, entre outras coisas, à circunstância de a programação americana na televisão alemã conter quatro vezes mais violência que a programação alemã, de acordo com uma análise de conteúdo. Em uma análise de conteúdo sueca de todos os programas, com exceção dos noticiários, em seis canais de TV, 62% do tempo de violência (isto é, sequências puras de violência) consistia em cenas violentas de origem norte-americana. Neste caso, as sequências de violência em trailers não foram levadas em consideração; elas somavam 15% do tempo total de violência. Uma vez que os trailers frequentemente são anúncios de filmes de ação que entrarão a seguir, pode-se estimar que cerca de 70% do tempo de violência seja de origem norte-americana.
A concentração da propriedade da mídia não vale só para a televisão,
filmes de vídeo e cinema, mas também para revistas em quadrinhos, jogos
eletrônicos etc. Assim, esta concentração de poder não resulta em multiplicidade, variação cultural e liberdade de expressão, em que a maioria das pessoas pode ser ouvida, mas em unilateralidade e uma espécie de censura privada.
Muitos países estão preocupados com a unilateralidade dos programas e filmes importados que eles não podem contrabalançar com sua própria produção, embora seja impossível, naturalmente, fazer uma generalização entre as nações, uma vez que as condições e pré-requisitos são diferentes (por exemplo, o Japão e a Índia exportam muitos programas de TV e filmes para outros países asiáticos; o Brasil, muitos programas para a América Latina; a Austrália, programas para a Ásia e países de língua inglesa etc.). Um exemplo disso é a situação na antiga Europa Oriental. Aqui, o alívio sentido depois da liberação da censura, confirmada pela queda do Muro de Berlim em l989, foi obscurecido pela surpresa e contragosto atualmente experimentados por partes da população, devido à grande quantidade de programas e filmes violentos e pornográficos invadindo as fronteiras desses países, onde, cada vez mais, vozes se levantam exigindo legislação da mídia, e novas regras e leis nacionais relativas à violência na mídia, aprovadas na década de 90, existem na maioria dos países da Europa Oriental.
Ao mesmo tempo, é importante notar que as pessoas, em média, preferem assistir a programas de TV não-violentos, pelo menos de acordo com uma análise norte-americana. De muitas nações do mundo vêm relatórios de que os habitantes locais preferem assistir a programas produzidos em seus países, se essa alternativa existir - novelas nacionais, ficção nacional etc. Contudo, essas alternativas 50 são poucas ou inexistentes. É caro produzir drama ou ficção e, na maioria dos países, não se pode esperar que os gastos resultem em receita de exportação, como acontece nos EUA, que dominam a exportação mundial nesta área.
O que domina a violência na mídia, então, não é primariamente a
popularidade, mas o marketing global. A concentração da propriedade da mídia também dificulta o sucesso doméstico de recém-chegados, empresas menores ou de produção alternativa, que são, portanto, obrigados a entrar no ramo de vídeos e venda para o exterior. Seus produtos precisam de um ingrediente dramático que não exija tradução e se ajuste a tantas culturas quanto possível. Esse ingrediente é, em geral, a violência. Um estudo feito nos EUA indica que os programas norte-americanos exportados para outros países contêm mais violência que os programas americanos transmitidos nos EUA.
Tudo isso significa, entre outras coisas, que quase 90% das crianças com 12 anos de idade estão familiarizadas com personagens violentos como o
Exterminador do Futuro e Rambo, de acordo com um estudo global feito em
23 países. Em algumas nações, e não menos nos países ocidentais, a pesquisa criminológica indica que a violência na sociedade aumentou nas últimas décadas. Além disso, estatísticas recentemente publicadas mostram que a violência se tornou mais comum entre crianças e jovens com menos de 15 anos de idade.

*Marilene Parente é Bacharel em Direito

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