Marilene Parente |
Prosseguindo
a discussão da violência que a mídia coloca nos nossos lares a toda hora, com
base em um livro publicado pela UNESCO, começo contando uma experiência que
tive há uma semana, quando fui a uma das mais frequentadas pizzarias da cidade
de Itaituba. Ao chegar lá, encontrei uma festinha de aniversário de um
coleguinha do Parentinho, onde havia algumas crianças. Bem ao lado, um senhor
bem parecido, de cerca de 30 anos, com o controle remoto da TV da pizzaria na
mão para que ninguém trocasse de canal, assistia ao filme O Exorcista. Ninguém
da direção tomou providência. Dois dias depois voltei ao mesmo local, onde
encontrei outro senhor um pouco mais velho, com duas crianças, uma de mais ou
menos cinco anos e outra de uns três anos vendo um filme violento no mesmo
aparelho de TV. Aquilo me chocou muito.
Em ambos os casos mandei meu filho sentar de costas para o televisor. Isso
demonstra o quanto a violência foi banalizada.
Voltando
ao trabalho da UNESCO, o fato de os EUA distribuírem a maior parte da violência
na mídia no mundo todo leva, entre outras coisas, à circunstância de a
programação americana na televisão alemã conter quatro vezes mais violência que
a programação alemã, de acordo com uma análise de conteúdo. Em uma análise de
conteúdo sueca de todos os programas, com exceção dos noticiários, em seis
canais de TV, 62% do tempo de violência (isto é, sequências puras de violência)
consistia em cenas violentas de origem norte-americana. Neste caso, as
sequências de violência em trailers não foram levadas em consideração;
elas somavam 15% do tempo total de violência. Uma vez que os trailers frequentemente
são anúncios de filmes de ação que entrarão a seguir, pode-se estimar que cerca
de 70% do tempo de violência seja de origem norte-americana.
A
concentração da propriedade da mídia não vale só para a televisão,
filmes de
vídeo e cinema, mas também para revistas em quadrinhos, jogos
eletrônicos
etc. Assim, esta concentração de poder não resulta em multiplicidade, variação
cultural e liberdade de expressão, em que a maioria das pessoas pode ser
ouvida, mas em unilateralidade e uma espécie de censura privada.
Muitos
países estão preocupados com a unilateralidade dos programas e filmes
importados que eles não podem contrabalançar com sua própria produção, embora
seja impossível, naturalmente, fazer uma generalização entre as nações, uma vez
que as condições e pré-requisitos são diferentes (por exemplo, o Japão e a
Índia exportam muitos programas de TV e filmes para outros países asiáticos; o
Brasil, muitos programas para a América Latina; a Austrália, programas para a
Ásia e países de língua inglesa etc.). Um exemplo disso é a situação na antiga
Europa Oriental. Aqui, o alívio sentido depois da liberação da censura,
confirmada pela queda do Muro de Berlim em l989, foi obscurecido pela surpresa
e contragosto atualmente experimentados por partes da população, devido à
grande quantidade de programas e filmes violentos e pornográficos invadindo as
fronteiras desses países, onde, cada vez mais, vozes se levantam exigindo
legislação da mídia, e novas regras e leis nacionais relativas à violência na
mídia, aprovadas na década de 90, existem na maioria dos países da Europa
Oriental.
Ao
mesmo tempo, é importante notar que as pessoas, em média, preferem assistir a
programas de TV não-violentos, pelo menos de acordo com uma análise
norte-americana. De muitas nações do mundo vêm relatórios de que os habitantes
locais preferem assistir a programas produzidos em seus países, se essa
alternativa existir - novelas nacionais, ficção nacional etc. Contudo, essas
alternativas 50 são poucas ou inexistentes. É caro produzir drama ou ficção e,
na maioria dos países, não se pode esperar que os gastos resultem em receita de
exportação, como acontece nos EUA, que dominam a exportação mundial nesta área.
O
que domina a violência na mídia, então, não é primariamente a
popularidade,
mas o marketing global. A concentração da propriedade da mídia também dificulta
o sucesso doméstico de recém-chegados, empresas menores ou de produção alternativa,
que são, portanto, obrigados a entrar no ramo de vídeos e venda para o
exterior. Seus produtos precisam de um ingrediente dramático que não exija
tradução e se ajuste a tantas culturas quanto possível. Esse ingrediente é, em
geral, a violência. Um estudo feito nos EUA indica que os programas
norte-americanos exportados para outros países contêm mais violência que os
programas americanos transmitidos nos EUA.
Tudo
isso significa, entre outras coisas, que quase 90% das crianças com 12 anos de
idade estão familiarizadas com personagens violentos como o
Exterminador
do Futuro e Rambo,
de acordo com um estudo global feito em
23 países. Em algumas
nações, e não menos nos países ocidentais, a pesquisa criminológica indica que
a violência na sociedade aumentou nas últimas décadas. Além disso, estatísticas
recentemente publicadas mostram que a violência se tornou mais comum entre
crianças e jovens com menos de 15 anos de idade.*Marilene Parente é Bacharel em Direito
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